domingo, abril 07, 2013

Grandes Cientistas # Bons Matemáticos


E. O. Wilson revela um segredo: Descobertas surgem de idéias, não de números impressionantes

Professor emérito de Harvard, Edward O. Wilson (Jim Harisson/Wikimedia/Commons) 

Para alguns jovens que pensam em se tornar cientistas, a matemática é o grande pesadelo. Sem conhecimento matemático, como é que se pode fazer um trabalho científico de verdade? Bom, eu tenho um segredo profissional para revelar: alguns dos cientistas mais bens sucedidos do mundo atualmente são semi-analfabetos em matemática.

Durante décadas como professor de biologia em Harvard, vi com tristeza estudantes brilhantes desistirem da carreira científica temendo que não pudessem obter sucesso sem grandes habilidades matemáticas. Esse equívoco tem privado a ciência de enorme quantidade de talentos, muitos deles desperdiçados. Isso criou uma hemorragia criativa que precisa ser estancada.

Falo com autoridade sobre o assunto porque eu mesmo sou um caso extremo. Até o primeiro ano na Universidade do Alabama, eu não sabia nada sobre álgebra porque estudei durante anos nas escolas precárias de Southern. Só fui aprender a calcular aos 32 anos, quando me tornei professor de Harvard e depois que sentei, desconfortavelmente, em uma sala de aula com estudantes que tinham pouco mais que a metade da minha idade. Dois deles eram alunos no curso de biologia evolucionista da qual eu era o professor. Tive que engolir o meu orgulho e aprender a calcular.

Quando jovem, fui um estudante que mal se aproximava da nota C, e só consegui me tranqüilizar quando descobri que ter uma grande habilidade em matemática era a mesma coisa que ser fluente em línguas estrangeiras. Em línguas é assim: com um pouco mais de esforço e algumas sessões de conversação com estrangeiros, consegue-se falar bem. Mas tudo isso compromete o laboratório e os campos de pesquisa, e nos faz avançar em uma única direção.

Felizmente, o dom excepcional exigido pela matemática se restringe somente a algumas disciplinas, tais como a física, astrofísica e teoria da informação. Além disso, mais importante do que a ciência como um todo é a habilidade de criar conceitos, momento em que o pesquisador vislumbra intuitivamente imagens e modelos de pesquisa.

Às vezes, todo mundo viaja em idéias como um cientista. Bem organizadas, as fantasias são o fio condutor de todo o pensamento criativo. Newton sonhava, Darwin sonhava, você sonha. Nossos primeiros devaneios são sempre muito vagos. Aos poucos vão tomando forma, e crescem com maior consistência a medida que são esboçados em blocos de papel e que ganham vida como exemplos reais do objetivo da pesquisa.

Os primeiros cientistas raramente fizeram descobertas extraindo idéias da matemática pura. A imagem estereótipo de cientistas estudando linhas e mais linhas de equações no quadro negro servem para exemplificar apenas descobertas já realizadas. As verdadeiras “sacadas” surgem no campo das anotações, no meio do escritório abarrotado de papéis rabiscados, no corredor durante uma discussão com um amigo ou no almoço solitário. Os momentos de Eureca resultam de trabalho pesado. E foco.

Idéias científicas surgem com facilidade quando os envolvidos na pesquisa trabalham em prol do bem comum, em benefício de todos. De forma intuitiva, os pesquisadores organizam suas idéias para melhor extrair um fragmento real sobre tudo que existe. Quando algo novo é encontrado, é necessário aplicar um modelo de avaliação que sempre exige métodos estatísticos ou matemáticos para dar prosseguimento às análises. As dificuldades técnicas que surgem nessa fase são duras para quem realizou a descoberta, por outro lado, a matemática e a estatística podem ser vistas como grandes colaboradores.

Na década de 1970, desenvolvi junto com o teórico matemático George Oster os princípios de casta e de divisão de trabalho em sociedades de insetos. Forneci os detalhes a respeito do que havia sido descoberto na natureza e nos laboratórios, e ele utilizou seu kit de ferramentas, cheio de hipóteses e teorias, para capturar esses fenômenos. Sem as minhas informações, Oster poderia até desenvolver uma teoria geral, mas não teria como deduzir quais as variações seriam possíveis em relação aos fenômenos.

Durante anos, publiquei diversos estudos em co-autoria com estatísticos e matemáticos afim de oferecer mais credibilidade aos princípios adotados. Chamo a isso de o 1° Princípio de Wilson: é bem mais fácil para os cientistas adquirir a colaboração indispensável de estatísticos e matemáticos dos que os mesmos encontrar cientistas capazes de utilizar suas equações.

Esse impasse é um caso específico na biologia, onde fatores da vida real se transformam em fenômenos mal compreendidos ou que passam despercebidos, sem que sejam notados. Os anais teóricos da biologia estão entupidos de modelos matemáticos que podem ser satisfatoriamente ignorados ou, se testados, falhos. É bem provável que somente 10% de tudo isso tenha valor duradouro. Ou seja, salvam-se aqueles ligados diretamente com o conhecimento empregado na vida real.

Se o seu nível de competência matemática é pequeno, planeje aumentá-lo, entretanto, saiba que você pode fazer um trabalho científico marcante com o que você tem em mãos. Mas, pense duas vezes, ao se especializar em campos que trabalham com experimentos de estreita alternância e com análises quantitativas. Isso inclui a maioria dos químicos e físicos, bem como alguns especialistas em biologia molecular.

Newton inventou cálculos como forma de dar vazão a sua imaginação. Darwin não tinha quase habilidade alguma em matemática, mas, com a enorme quantidade de informações que acumulou, pode conceber sistemas que tempos depois seriam utilizados por matemáticos.

Aos aspirantes a cientista, o primeiro passo é encontrar um assunto que seja profundamente interessante e que se tornará seu principal foco. Ao fazê-lo, tenha em mente o 2° Princípio de Wilson: para todo cientista, existe uma disciplina cujo o nível de exigência em matemática não compromete o alcance da excelência.

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