terça-feira, abril 09, 2013

Penny Bailey e o jornalismo científico: “o ideal é sempre contar uma boa história”


Blog do The Guardian acompanhou o Prêmio de Jornalismo Científico Wellcome Trust 2013 e perguntou aos principais jornalistas do setor como é trabalhar com ciência.

Sala com genomas no Wellcome Collection (Russ London/Wikimedia/Commons)

The Guardian: O que faz uma história sobre ciência ser interessante?

Penny Bailey: “Intensidade”, a história tem que mexer com você. E os sentimentos de intensidade surgem a partir de uma série de abordagens, tais como:
- Os aspectos humanos da história – com a exposição das principais características do (s) personagem (ns) e a sua jornada pessoal –, o lado científico e as pessoas cujas vidas serão afetadas pela ciência.
- Alguns elementos inerentes ao drama – como por exemplo, os obstáculos aparentemente intransponíveis, concorrência, tomada de decisões, problemas e soluções, e cronogramas.
- As surpreendentes artimanhas científicas.
- O ineditismo da história – se a história não é inédita, deve-se abordar o assunto de uma forma diferente, nova.

É preciso entender de ciência para se escrever um bom texto?

O importante é contar uma boa história. É óbvio que se você entende de ciência, ou dos temas relacionados com a área, sua discussão será mais consistente.

Como você começa os seus textos?

Eu costumo escrever todo o artigo primeiro para depois fazer o lead (embora eu já tenha idéia do que eu quero destacar). Porque a abertura é um ponto crítico para atrair o leitor – além disso, minhas melhores idéias raramente são aquelas que penso de imediato –, por isso, sempre utilizo abordagens diferentes antes de selecionar aquela que considero a mais atrativa e relevante para começar a história.

Como você faz para extrair as informações de um entrevistado?

Ter em mente o que eu pretendo escrever e o que devo questionar junto ao entrevistado ajuda bastante – assim como deixar claro as minhas intenções antes de começar a entrevista. É recomendável também sempre ter uma lista de perguntas. Alguns cientistas são naturalmente grandes contadores de histórias e, nesse caso, você tem só que ouvi-los, mas outros – que não deixam de ter boas histórias para contar – necessitam de um pouco mais de conversa e incentivo.

Você trabalha com analogias e metáforas nos seus textos?

Sim, para facilitar o entendimento da história ao explicar conceitos mais complexos.

Quanta informação fica fora dos textos?

Isso depende muito da pauta e do limite de caracteres. Geralmente, deixo de fora coisas que não comprometem o texto e que realmente não acrescentam algo novo a história, mesmo que sejam informações interessantes.

Como equilibrar o texto objetivo com a pegada de um contador de histórias? É possível?

Se estou avaliando uma situação complexa nas quais as respostas não são fáceis (ou que não sejam muito claras), tento manter a objetividade e equilibrar as diferentes opiniões e pontos de vista. Outra possibilidade, é trazer o furo na resposta final. Se tenho o meu ponto de vista da situação, foco nos elementos da história para apoiar essa visão.

Qual é o maior contratempo no ramo de quem escreve sobre ciência?

É muito fácil se envolver com os detalhes técnicos da ciência e desprezar os elementos que dão vida à história.

Penny Bailey é escritor do Wellcome Trust.

Da Série: O Segredo dos grandes jornalistas científicos
Prêmio de Jornalismo Científico Wellcome Trust 2013
Uma parceria entre o The Guardian e o The Observer

Fonte: The Guardian

domingo, abril 07, 2013

Grandes Cientistas # Bons Matemáticos


E. O. Wilson revela um segredo: Descobertas surgem de idéias, não de números impressionantes

Professor emérito de Harvard, Edward O. Wilson (Jim Harisson/Wikimedia/Commons) 

Para alguns jovens que pensam em se tornar cientistas, a matemática é o grande pesadelo. Sem conhecimento matemático, como é que se pode fazer um trabalho científico de verdade? Bom, eu tenho um segredo profissional para revelar: alguns dos cientistas mais bens sucedidos do mundo atualmente são semi-analfabetos em matemática.

Durante décadas como professor de biologia em Harvard, vi com tristeza estudantes brilhantes desistirem da carreira científica temendo que não pudessem obter sucesso sem grandes habilidades matemáticas. Esse equívoco tem privado a ciência de enorme quantidade de talentos, muitos deles desperdiçados. Isso criou uma hemorragia criativa que precisa ser estancada.

Falo com autoridade sobre o assunto porque eu mesmo sou um caso extremo. Até o primeiro ano na Universidade do Alabama, eu não sabia nada sobre álgebra porque estudei durante anos nas escolas precárias de Southern. Só fui aprender a calcular aos 32 anos, quando me tornei professor de Harvard e depois que sentei, desconfortavelmente, em uma sala de aula com estudantes que tinham pouco mais que a metade da minha idade. Dois deles eram alunos no curso de biologia evolucionista da qual eu era o professor. Tive que engolir o meu orgulho e aprender a calcular.

Quando jovem, fui um estudante que mal se aproximava da nota C, e só consegui me tranqüilizar quando descobri que ter uma grande habilidade em matemática era a mesma coisa que ser fluente em línguas estrangeiras. Em línguas é assim: com um pouco mais de esforço e algumas sessões de conversação com estrangeiros, consegue-se falar bem. Mas tudo isso compromete o laboratório e os campos de pesquisa, e nos faz avançar em uma única direção.

Felizmente, o dom excepcional exigido pela matemática se restringe somente a algumas disciplinas, tais como a física, astrofísica e teoria da informação. Além disso, mais importante do que a ciência como um todo é a habilidade de criar conceitos, momento em que o pesquisador vislumbra intuitivamente imagens e modelos de pesquisa.

Às vezes, todo mundo viaja em idéias como um cientista. Bem organizadas, as fantasias são o fio condutor de todo o pensamento criativo. Newton sonhava, Darwin sonhava, você sonha. Nossos primeiros devaneios são sempre muito vagos. Aos poucos vão tomando forma, e crescem com maior consistência a medida que são esboçados em blocos de papel e que ganham vida como exemplos reais do objetivo da pesquisa.

Os primeiros cientistas raramente fizeram descobertas extraindo idéias da matemática pura. A imagem estereótipo de cientistas estudando linhas e mais linhas de equações no quadro negro servem para exemplificar apenas descobertas já realizadas. As verdadeiras “sacadas” surgem no campo das anotações, no meio do escritório abarrotado de papéis rabiscados, no corredor durante uma discussão com um amigo ou no almoço solitário. Os momentos de Eureca resultam de trabalho pesado. E foco.

Idéias científicas surgem com facilidade quando os envolvidos na pesquisa trabalham em prol do bem comum, em benefício de todos. De forma intuitiva, os pesquisadores organizam suas idéias para melhor extrair um fragmento real sobre tudo que existe. Quando algo novo é encontrado, é necessário aplicar um modelo de avaliação que sempre exige métodos estatísticos ou matemáticos para dar prosseguimento às análises. As dificuldades técnicas que surgem nessa fase são duras para quem realizou a descoberta, por outro lado, a matemática e a estatística podem ser vistas como grandes colaboradores.

Na década de 1970, desenvolvi junto com o teórico matemático George Oster os princípios de casta e de divisão de trabalho em sociedades de insetos. Forneci os detalhes a respeito do que havia sido descoberto na natureza e nos laboratórios, e ele utilizou seu kit de ferramentas, cheio de hipóteses e teorias, para capturar esses fenômenos. Sem as minhas informações, Oster poderia até desenvolver uma teoria geral, mas não teria como deduzir quais as variações seriam possíveis em relação aos fenômenos.

Durante anos, publiquei diversos estudos em co-autoria com estatísticos e matemáticos afim de oferecer mais credibilidade aos princípios adotados. Chamo a isso de o 1° Princípio de Wilson: é bem mais fácil para os cientistas adquirir a colaboração indispensável de estatísticos e matemáticos dos que os mesmos encontrar cientistas capazes de utilizar suas equações.

Esse impasse é um caso específico na biologia, onde fatores da vida real se transformam em fenômenos mal compreendidos ou que passam despercebidos, sem que sejam notados. Os anais teóricos da biologia estão entupidos de modelos matemáticos que podem ser satisfatoriamente ignorados ou, se testados, falhos. É bem provável que somente 10% de tudo isso tenha valor duradouro. Ou seja, salvam-se aqueles ligados diretamente com o conhecimento empregado na vida real.

Se o seu nível de competência matemática é pequeno, planeje aumentá-lo, entretanto, saiba que você pode fazer um trabalho científico marcante com o que você tem em mãos. Mas, pense duas vezes, ao se especializar em campos que trabalham com experimentos de estreita alternância e com análises quantitativas. Isso inclui a maioria dos químicos e físicos, bem como alguns especialistas em biologia molecular.

Newton inventou cálculos como forma de dar vazão a sua imaginação. Darwin não tinha quase habilidade alguma em matemática, mas, com a enorme quantidade de informações que acumulou, pode conceber sistemas que tempos depois seriam utilizados por matemáticos.

Aos aspirantes a cientista, o primeiro passo é encontrar um assunto que seja profundamente interessante e que se tornará seu principal foco. Ao fazê-lo, tenha em mente o 2° Princípio de Wilson: para todo cientista, existe uma disciplina cujo o nível de exigência em matemática não compromete o alcance da excelência.

sábado, abril 06, 2013

Geoff Brumfiel e o jornalismo científico: “Ouça opiniões contrárias”


Blog do The Guardian acompanhou o Prêmio de Jornalismo Científico Wellcome Trust 2013 e perguntou aos principais jornalistas do setor como é trabalhar com ciência.

Apatosauro, Museu de História Natural de Nova Iorque (Wikimedia)

The Guardian: O que faz uma história sobre ciência ser interessante?

Geoff Brumfiel: Tem muita coisa em ciência que pode se transformar em boas histórias. Podemos escrever sobre uma nova pesquisa, bem como alertar a potencial ameaça presente em uma nova tecnologia. Ou simplesmente fazer com que as pessoas pensem o mundo de uma forma um pouco diferente.

É preciso entender de ciência para se escrever um bom texto?

Meu primeiro editor dizia que era muito mais importante saber escrever do que entender de ciência. Ele tinha razão, no entanto, o conhecimento científico ajuda bastante!

Como você começa os seus textos?

Cuidadosamente. Nas reportagens, em especial, você tem de acertar na primeira linha, se não anula o resto da matéria.

Como você faz para extrair as informações de um entrevistado?

Silêncio. Na tentativa de preencher uma desconfortável lacuna no diálogo, as pessoas acabam contando coisas interessantes.

Você trabalha com analogias e metáforas nos seus textos?

Com moderação, apenas nos momentos necessários.

Quanta informação fica fora dos textos?

Bastante, mas acredito que não sejam as mais importantes.

Como equilibrar o texto objetivo com a pegada de um contador de histórias? É possível?

Objetividade é tudo o que um escritor profissional precisa ter, sendo assim, você tem que encontrar os melhores caminhos nesse sentido. Parece que, com o passar dos anos, isso fica estranhamente mais fácil. Mas se você não quer ter problemas, a coisa mais correta a se fazer é ouvir opiniões contrárias, e respeitá-las. Ou então, apenas citá-las em seus textos.

Qual é a maior inverdade no ramo de quem escreve sobre ciência?

As pessoas pensam que quem escreve sobre ciência promove a ciência ou o pensamento científico. Isso não é verdade, o trabalho de qualquer repórter é informar as pessoas a respeito de tudo o que acontece ao nosso redor.

Geoff Brumfiel é jornalista de ciência da NPR e um dos fundadores da Nature.

Da Série: O Segredo dos grandes jornalistas científicos
Prêmio de Jornalismo Científico Wellcome Trust 2013
Uma parceria entre o The Guardian e o The Observer

Fonte: The Guardian